A Alfaiataria e o Poder do Terno – História da Moda

Na história do vestuário, o surgimento do traje de alfaiataria deve ser entendido como o divisor de águas que distingue a roupa moderna da roupa do mundo contemporâneo.

Ao longo da história, o vestuário masculino foi sempre mais avançado que o feminino. O traje do homem foi sempre plataforma dos avanços tecnológicos têxteis e formais porque sempre apontou as mudanças sociais na imagem do provedor, do guerreiro, do político e do religioso. Mas quando se fala do fenômeno da moda, o traje feminino toma a dianteira nos temas de estudo e mesmo como fonte de observação para estudos fenomenológicos, por isso, aqui, trataremos do traje masculino e sua permanência formal como fenômeno igualmente importante para a moda e a “não-moda”.

A moda, além da efemeridade e inconstância, carrega, através das roupas, a qualidade de construir a identidade privada, definindo primeiramente o eu do indivíduo pela sexualidade, tendo o corpo, como o demonstrador dos gêneros.

O vestuário feminino tem sempre um apelo visual teatral e a roupa masculina determina o padrão real do vestir socializado, incluindo nele suas versões informais, a roupa esportiva, roupa para férias, fim de semana e o traje urbano formal usado para trabalho ou diversão.

O conjunto calça-paletó-camisa, formal ou informal, conhecido como o Terno Masculino, constitui o que conhecemos como alfaiataria, que é composto por uma gama grande de variedades de paletós, calças, camisas, coletes, casacos e gravatas.

Este composto de traje tem sido considerado pelos usuários de moda masculina como enfadonho e repetitivo, porém, o que se questiona de fato é que, num mundo onde a efemeridade dá o tom na cultura das aparências, porque o terno continua sendo o traje civil clássico em todo o planeta?

Pergunta-se como a alfaiataria se relaciona com a moda e quais os valores que ela sinaliza que a torna tão eficaz, mesmo diante da sensualidade tão fragmentada e dinâmica dos usuários pós-modernos.

Anne Hollander em sua obra O Sexo e as Roupas lembra que a moda é um fenômeno social e que as mudanças no vestuário são mudanças sociais também. Para ela, o poder da permanência da alfaiataria mostra a autoridade, a força simbólica e emocional dos valores de perpetuação. O terno tem um caráter abstrato e apresenta uma mensagem de continuidade formal que é profundamente satisfatório no mundo contemporâneo, por isso o seu não desaparecimento e a mudança do seu campo de atuação também para traje feminino e para o traje casual, o que trouxe mudança  para seu significado social e sexual.

Imagem do site Oficina de Estilo – A Alfaiataria e o Poder do Terno

O terno esteve inicialmente relacionado ao ofício do alfaiate e à tradição da roupa feita sob medida, à qual era agregada um valor de luxo e requinte que ultrapassava o da boa aparência, valor este que se tornou o maior da cultura masculina contemporânea. Assim, os avanços tecnológicos da indústria do vestuário foram chamados para participar da preservação da boa aparência do terno masculino, como resposta a algumas fantasias coletivas que até hoje se mantêm no poder.

O terno foi eleito como o agente apropriado da beleza da força e da sexualidade positiva do homem urbano e por esse motivo introduziu-se a alfaiataria dentro das regras do design de moda, ou seja, um produto manufaturado em série, oferecido no comércio varejista em diferentes tamanhos, formas, volumes e padrões têxteis.

A base estética que deu origem ao ideal moderno de elegância masculina procurou imitar a elegância e a eficiência da natureza. Esta ordem define que os seres humanos sejam complementados por roupas.

Relacionado com o vocabulário visual e estilístico da arte abstrata moderna, o terno mostra que, mesmo diante de tanta simplicidade, ele mantém o vigoroso apelo erótico que o fez nascer. Os ternos, assim como os carros, são sexy.

A Alfaiataria e o Poder do Terno

Este padrão da alfaiataria moderna surgiu no Ocidente no séc. XIX após o declínio do estilo Rococó, relacionando o Iluminismo à estética neoclássica, que sugeria como padrão de virilidade a força e a clareza da democracia grega unida ao modelo simples e eficiente da tecnologia construtiva romana. O ideal neoclásssico tornou-se erótico, politicamente correto e atraente, como forma de expressar as novas aspirações emocionais e sociais da contemporaneidade.

A mesma ordem estética foi repetida na arte e no design moderno e abstrato do séc. XX, após a queda do gosto romântico, vitoriano e art-nouveau.

A mudança na alfaiataria se deu na transferência do modo de fazer sob medida para o industrializado, que foi também a base da construção da roupa prêt-à-porter para ambos os sexos.

Outro dado importante sobre a permanência da alfaiataria vem da história do vestuário, cuja evolução tem sido entendida como um dueto entre o traje masculino e o feminino. A extensão de seu uso para as mulheres mostra uma trégua na relação dos papéis e traz à tona a grande discussão da androginia através da moda.

A alfaiataria, usada pela mulher, é o grande marco da história do vestuário no séc. XX. Como roupa de mulher, o terno tailleur carrega consigo os mesmos valores de sensualidade e poder que estão neste traje como roupa masculina. E é esta a condição que mantém a alfaiataria no topo das questões históricas do vestuário. Questões estas que têm se mostrado mais importantes do que as questões da moda e sua efemeridade.

Leia também O Terninho – Clássicos da Moda.

Marlene Dietrich que fez do terno seu emblema / Marlene no filme Marocco em 1932
que sacudiu o público com cenas picantes – A Alfaiataria e o Poder do Terno

Ricardo Almeida estilista brasileiro especializado em alfaiataria e maior referência brasileira em roupas sociais masculinas  – Imagem do blog Degrau / Roberto Justus, publicitário, apresentador e um dos empresários da comunicação do Brasil. O terno é uma constante nas posições de poder

Coleção do estilista  Ricardo Almeida  via blog Hypercool

A História do Terno

Imagem do site Oficina de Estilo

No site  O Globo você encontra ótima matéria com a história do terno executivo por Lula Rodrigues, autor do livro o Almanque da Moda Masculina. Dica do  Oficina de Estilo.

” (…) A história do terno executivo moderno, traje oficial de estadistas e homens de negócios ocidentais, que teve como berço esplêndido, a Versailles de Luis XIV, no século XVII. O ambiente era luxuoso e, não menos formal do que as salas de reunião de presidentes de grarndes multinacionais.

Foi lá, na morada real, em Versailles, onde habitavam cerca de 10 mil nobres ( 5 mil fazendo tudo e outros 5 mil de frosô), que os alfaiates do Rei Sol – os melhores da Europa – tiveram a idéia de fazer a roupa básica do soberano, composta de casaca, colete e culotes, tudo no mesmo tecido. Três peças, daí terno, como já venho falando neste singelo blog. Como diz uma amiga da web, simples assim.”

Leia matéria completa e veja todas as imagens no site  O Globo.

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Terno do século XVIII (1785-1790) / Imagem do site o O Globo

O terno permanece como símbolo de status e poder

Os ternos, assim como os carros, são sexy

Homem de terno Versace –  Imagem do blog Binside TV

Terno Armani

Chanel e Marlene Dietrich – Inspiradas no universo masculino

A alfaiataria, usada pela mulher, é o grande marco da história do vestuário no séc. XX

Marlene Dietrich que fez do terno seu emblema / Marlene no filme Marocco em 1932
que sacudiu o público com cenas picantes

Filme sobre a vida da Chanel, primeira estilista a trazer para suas criações o universo masculino

Clássico tailleur  da Chanel – o terno tailleur carrega consigo os mesmos valores de sensualidade e poder que estão neste traje como na roupa masculina

Gabrielle “Coco” Chanel e suas criações a partir do universo masculino. Ela foi a grande criadora do tailleur – versão feminina do terno

A alfaiataria permanece como símbolo de poder. Neste caso, foi usada em couro e também traz o fetiche como referência,  apresentando uma mulher poderosa, provocativa e desafiante

Celebridades apostam na alfaiataria

A atriz Taís AraujoImagem do site ClicRBS e Victoria Beckham

A cantora Ivete Sangalo via Fotolog

Coleção masculina da Versace para o próximo inverno

Leia também O Terninho – Clássicos da Moda.

Por Queila Ferraz

a história do terno executivo moderno, traje oficial de estadistas e homens de negócios ocidentais, que teve como berço esplêndido, a Versailles de Luis XIV, no século XVII. O ambiente era luxuoso e, não menos formal do que as salas de reunião de presidentes de grarndes multinacionais.

Queila Ferraz: Queila Ferraz é historiadora de moda e arte, especialista em processos tecnológicos para confecção e consultora de implantação para modelos industriais para a área de vestuário. Trabalhou como coordenadora Geral do Curso de Design de Moda da UNIP, professora da Universidade Anhembi Morumbi e dos cursos de pós-graduação de Moda do Senac e da Belas Artes.
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