Moda é a Comunicação

Texto interessante com várias reflexões sobre Moda como Comunicação, no site Domínio Feminino. Por Flávia Vasconcelos de Mendonça (…)A condição humana depende deste contato, contágio….

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Texto interessante com várias reflexões sobre Moda como Comunicação, no site Domínio Feminino.

Por Flávia Vasconcelos de Mendonça
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(…)A condição humana depende deste contato, contágio. Sendo impossível o sustento de qualquer cultura sem que haja a transmissão de alguma forma daquilo que se passa dentro de nós. Uma sociedade não se concretiza sem que os indivíduos se comuniquem através de quaisquer dos cinco sentidos que conhecemos cientificamente. O ser humano, simplesmente, não existe sozinho.

“Consideramos pois, a condição humana. Veremos que inclui: um equilíbrio biológico fundamental; um conjunto de relações dinâmicas entre os homens e seu meio material – relações estas que se manifestam mediante o desenvolvimento de técnicas; um conjunto de relações dos homens entre si, que caracteriza ao mesmo tempo a estática e a dinâmica da existência social; finalmente, um conjunto de formas de expressão de que se serve o homem, ao mesmo tempo, para tratar de dizer o que é e que faz, ou pelo menos, o que crê ser e fazer, e ipso facto, para ordenar, obrigar e, finalmente, compelir os outros e a si próprio.:” ( Cohen-Seat, Gilbert e Fougeyrollas, Pierre – “Introduction”, in L’action sur l’homme: cinemá et television, Paris)

Dentro desta necessidade de comunicação está a Moda. “Com a moda começa o poder social dos signos ínfimos, o espantoso dispositivo de distinção social conferido ao porte das novidades sutis” ( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero). A moda impera em todos os meios de comunicação da sociedade moderna. A partir do momento estamos fazendo uso de certa indumentária, adquirindo hábitos e nos transformando de diversas formas para se ajustar a realidade, estamos também produzindo e respondendo aos estímulos que nos rodeiam, estamos nos comunicando fazendo uso da moda.

Note que este fenômeno é exclusivo da civilização ocidental, pois é nesta que a Moda surge como sistema, onde as metamorfoses incessantes das formas e ornamentações transformam-se em valor mundano e a inconstância da indumentária passa a caminhar de forma oposta à lógica da tradição se fazendo regra permanente desde o final da Idade Média até os tempos de hoje. Com a moda, aparece uma primeira manifestação social que encarna um novo tempo legítimo e uma nova paixão própria ao Ocidente, a do “moderno”.

Além disso, através da moda os seres passam a observar-se , avaliando as diferenças de corte, de cores, de motivos de indumentária e apreciam as aparências recíprocas. A moda liga-se ao prazer de ver e de ser visto, favorece o olhar crítico e estimula observações sobre a elegância dos outros, sendo assim, um completo investigamento de si.

Nesta análise a moda é vista, não apenas como meio de comunicação ativado no vestir, é importante deixar claro que a moda abrange em velocidades diversas outros campos como a arquitetura, a linguagem, as maneiras, os gostos e idéias e obras culturais. Com isso quero reconhecer o posto da informação visual no surgimento de um futuro radicalmente novo.

A afirmação do título “Moda é a Comunicação século XXI” se baseia nos dias de hoje, onde grande parte da informações que recebemos através dos grandes meios ( TV, rádio, jornais , revistas e Internet ) nos oferecem um universo da novidade, do lazer, do esquecimento e do sonho. A mídia tem o dever de informar, é claro, mas através do prazer, na renovação, no entretenimento. Todas as transmissões com vocação cultural ou informativa devem adotam a perspectiva do lazer, só assim conseguem “abocanhar” um público mais numeroso. Para isso a ordem da sedução é prioritária, e é neste momento que a moda simplesmente se encaixa. No universo da mídia que constantemente é submetido aos recursos publicitários, é a forma Moda que organiza a produção e a difusão dos programas, que regula a forma, a natureza e os horários das transmissões. A Comunicação de hoje depende da moda para seguir seu rumo e a explosão numérica do audio-visual apenas aumenta tal competição que cada vez mais irá se firmar sobre o princípio da sedução. Além disso, é sobre os numéricos novos programas que será preciso exibir outros encantos, imaginar novas apresentações e novas fórmulas de prender a atenção. Mais do que nunca a pequena diferença, lei da moda, fará a sedução.

“Da mesma forma que a moda do século XVIII se pôs a brincar com grandes e pequenas coisas da história, a divertir-se em fitas e penteados com o sistema de Law, com as revoltas populares, com a derrota do Sena, hoje a informação não cessa em adota um estilo descontraído e lúdico em relação aos fatos do dia, o código humorístico fez passar o registro da informação para a lógica desenvolta e fantasiosa da moda”. ( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

História da Moda

É importante para o melhor entendimento desta análise descrever em pequena prévia o surgimento e estabelecimento da moda até os dias atuais:

Como já foi dito anteriormente, a moda caminha de forma oposta à lógica da tradição, ou seja há uma relativa depreciação do passado e a novidade é vista como algo superior, contrariando à tradição, onde o conservadorismo rege a lei da imobilidade através de uma continuidade social. Nas sociedades primitivas, a imposição de modelos herdados do passado impedem o aparecimento da moda.

“Enquanto nas eras de costumes reinam o prestígio da antigüidade e a imitação dos ancestrais, nas eras da moda dominam o culto das novidades assim como a imitação dos modelos presentes e estrangeiros. Prefere-se ter semelhanças com os inovadores contemporâneos do que com os antepassados.”

( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Contudo, há um primeiro momento onde acontece um relativo abandono às normas coletivas que valorizam o legado ancestral, dando princípio à iniciativa estética, ao devaneio e à originalidade humana. Com o desuso da longa sobrecota em forma de blusão em proveito de um traje masculino mais curto, apertado na cintura, fechado por botões e descobrindo as pernas, modeladas em calções, e com o ajuste dos trajes femininos colocando em evidência o busto, os quadris e a curva das ancas, começa-se um ritmo precipitado de frivolidades, instalando o “reino das fantasias” de maneira sistemática e durável que se impõe durante cinco séculos. Este período que vai da metade do século XIV à metade do século XIX é considerado a fase inaugural da moda, momento onde esta revela seus traços sociais e estéticos mais característicos. Ou seja, a diferenciação social, a renovação das formas, o prazer em ornamentar-se, necessidade de ver e ser visto, apreciação do belo e liberdade individual na escolha das cores e cortes. Contudo, apenas grupos muito restritos que monopolizavam o poder de iniciativa e de criação tiveram acesso a este período. Trata-se do estágio aristocrático e artesanal da moda.

Porém, foi ao longo da segunda metade do século XIX que a moda, no sentido moderno do termo, instalou-se. Com os processos tecnológicos em todas as áreas, a moda viveu até 1960 um período que Lipovetsky chama de “moda de cem anos”: fase em que o sistema começa a se fragmentar e a se readaptar parcialmente, e época do surgimento de grandes costureiros como Mme. Coco Chanel , Charles Worth e Paul Poiret. Há o surgimento de duas vertentes, a Alta Costura que se baseia na criação de luxo e sob medida, considerada o laboratório das novidades ( lançadores de tendências ), e a Confecção que é a produção em massa a um custo mais baixo e menor qualidade ( seguidores de tendência ). A moda agora passava a produzir burocraticamente coleções sazonais com uma lógica serial industrial e desfiles de manequins com fins publicitários.

Mas, o que realmente interessa neste período é que a moda se torna objeto de desejo, onde o vestuário converte-se em concretizador de emoções, traços de personalidade e caráter. Não que desde o princípio, a indumentária não tenha tido este mesmo efeito, mas no século XX, a moda moderna, além de suas novas características estético-burocrática, industrial , democrata e individualista, também, se torna elemento chave na comunicação visual em massa. Particularmente, a Alta Costura passou a ser uma dessas instituições que punham as pessoas (artistas, grandes costureiros, esportistas de sucesso e gente do “show bussines”) no mais alto patamar, sacralizando seu estilo, fazendo com que sua individualidade fosse bajulada e desejada pelas massas. A moda passa a ser protagonista da indústria cultural.

“A Alta Costura é uma organização que, sendo burocrática, emprega não as tecnologias da coação disciplinar, mas processos inéditos de sedução que inauguram uma nova lógica do poder.
(…)
A imposição estrita de um corte cedeu lugar a sedução da opção e da mudança, tendo como réplica subjetiva a sedução do mito da individualidade , da originalidade, da metamorfose pessoal, do sonho do acordo efêmero do Eu íntimo e da aparência exterior.”

( Gilles Lipovetsky, O Império do Efêmero)

Dando fim a esse período de cem anos, surgiu em 1949 o prêt-a-porter (expressão desenvolvida por J.C. Weill que quer dizer “pronta para usar” — “ready to wear”), esta que revolucionou a lógica da produção industrial, pois agora era possível criar roupas em escala industrial , com maior qualidade e lançadoras de tendências. Ou seja, um mistura do glamour da Alta Costura ( que a princípio declinou com a chegada do prêt-a-porter ), com a eficiência da produção em série. Sem contar que a era do prêt-a-porter coincide com o fim da Segunda Guerra, onde o desejo de moda expandiu-se pelo cinema, através da multiplicação de revistas femininas, pelo baby boom que findou com poder de compra dos jovens, e pela vontade de viver o presente estimulada pela nova cultura de massa e consumo.

Junto ao prêt-a-porter, acontece outro fenômeno: já não se imita o superior, pelo contrário, imita-se o que se vê em torno de si, os trajes simples e divertidos, os modelos menos caros apresentados cada vez mais nas revistas. A lei vertical da imitação foi substituída por uma imitação horizontal, de acordo com uma sociedade de indivíduos reconhecidamente iguais. A influência da massa mediana é quem “comanda” a moda do final de século.

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