Lampião, Maria Bonita e a história do cangaço com fotos originais da época

Mais de 90 anos depois de sua morte, Lampião ainda vive por estar intrínseco na cultura popular brasileira. Um material original, restaurado e colorido dos tempos do Cangaço e de Lampião, possui grande beleza estética, histórica e cultural.

Fotos de Lampião e do cangaço – Através do Facebook de Ivo Da Costa Ramos, encontramos essas fotos originais, restauradas e coloridas artificialmente, dos tempos do Cangaço. São ainda, um valioso registro do  estilo de vida dos cangaceiros, um dos episódios mais marcantes da  história do Brasil.

Em sequência, registros iconográficos feitos pelo Benjamin Abrahão Botto (1890-1938). O fotógrafo libanês-brasileiro que viveu o cangaço e, desta forma, preservou essa história, através da arte fotográfica. Lembrando ainda que Benjamin morreu em nome da sua arte.

As fotos foram coloridas por Davi Lima e compartilhadas na Comunidade Antigas Propagandas e Antigas Saudades, Além da riqueza estética do movimento e beleza das imagens, segue ainda, uma breve história do cangaço. Confira!

Quem foi Lampião?

Foto/Rubens Antonio

Virgulino Ferreira da Silva era seu nome verdadeiro. No entanto, se tornou conhecido como o Rei do Cangaço, ou melhor dizendo, o Lampião. Nome inventado propriamente por ele, por afirmar que seu rifle era como um lampião, pois sempre estava a disparar muitos tiros que clareavam tudo ao redor.

Sua entrada ao cangaço é justificada pelo desejo de fazer justiça ao seu pai José Ferreira, barbaramente assinado em 1917. Não confiando na ação da justiça, pois os assassinos contavam com a proteção dos grandes. Sendo assim, Lampião resolveu fazer justiça por conta própria.

Percorrendo os sertões de Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Ceará, Virgulino entrou em combate com a polícia de todos esses Estados, juntamente com seu grupo e formando aliados contra o governo.

O que foi o cangaço?

Segundo o Nexo Jornal, o cangaço foi um fenômeno social, político e cultural de boa parte da região Nordeste (excetuando os estados do Piauí e do Maranhão). O chamado ciclo do cangaço tem diferentes datas como referência, mas abrange principalmente a segunda metade do século 19 e a primeira do século 20.

Basicamente, foi a organização social moldada por grupos de bandoleiros e excluídos que andavam armados cometendo crimes e vendendo proteção pela região da caatinga, em uma sociedade majoritariamente agrária e na qual não enxergavam mais uma possibilidade de viver na legalidade.

Quando aconteceu o cangaço, seu auge e declínio?

Embora o cangaço tenha se delineado sobretudo a partir da década de 1870, os principais grupos e ataques existiram na época da Primeira República (1889-1930). Quando o Brasil havia deixado de ser um Império monárquico e se tornado uma República Federativa.

Os cangaceiros ganharam maior projeção durante os anos 1920 e 1930. O fenômeno aparecia nos jornais e era um dos assuntos mais falados nas cidades por onde haviam passado e arredores. Eram comuns lendas e mentiras sobre o paradeiro, os feitos ou a morte de cangaceiros.

Atenção nacional

Apesar de seu caráter regional, o cangaço também recebia atenção nacional. Na Assembleia Constituinte de 1934, houve inclusive, debates de se incluir o combate ao cangaço na nova Constituição, por iniciativa de deputados nordestinos. Entretanto, a ideia não foi adiante. Parlamentares também pediam ao governo federal ajuda com verbas e tropas.

O movimento, contudo,  teve seu fim em  28 de Julho de 1938 ocorreu a morte de Lampião, Maria Bonita.

Lampião e Maria Bonita

Qual a origem do cangaço e seu contexto histórico?

 

Na Primeira República existiram diversos conflitos em áreas rurais do país, envolvendo questões como direitos sociais, controle de terras, distribuição de renda e disputa por poder. A maioria da população brasileira morava no campo. As desigualdades sociais e fundiárias contribuíram para a existência desses conflitos.

Houve movimentos de cunho religioso (como o Arraial de Canudos e o Caldeirão da Santa Cruz do Deserto) e trabalhista (como greves nas lavouras cafeeiras paulistas). E também houve o cangaço, o mais duradouro e amplo desses fenômenos.

 

As guerras e a importância do punhal

A guerra de velhacaria do cangaceiro era escondido para aproveitar o fator surpresa contra o adversário, usando seu punhal pelas costas. Quando faltava munição, por exemplo, o punhal era utilizado na zona de combate. Depois das armas de repetição, o punhal ficou apenas como símbolo.

 

 

Quem foram os cangaceiros

Um cangaceiro era, em geral, um homem que vivia em fuga e contra a lei — a participação conhecida das mulheres teve início apenas no fim do período, na década de 1930.

Eles roubavam, destruíam e assassinavam, seguindo seus próprios interesses e também atendendo àqueles que os protegiam. Esses protetores eram chamados de coiteiros, podendo ser governadores, proprietários de terra, vaqueiros, habitantes comuns, entre outros. Existia uma vasta rede de coiteiros por diferentes estados.

Aqui fotos originais de cangaceiros.
Fotos originais da época do cangaço

Lampião e sua influência política

Governos estaduais e municipais possuíam um relacionamento com Lampião, o que ficou registrado, através de recortes de jornais, cartas e fotos de Lampião. Havendo ainda, muitas cartas, envolvendo grande parte da elite de Sergipe, o que pode revelar formas de  comprometimento.

Um líder político que protegesse um bando de cangaceiros poderia, em troca, pedir que matassem ou saqueassem um inimigo seu. A proteção de poderosos foi, desta forma, um dos fatores que permitiram o fenômeno do cangaço se estender por décadas.

Foto/Robério Santos

Posteriormente, a polícia se apropriou desses documentos e acabou vendendo essas cartas a quem as havia enviado. Com isso, os envolvidos, compravam o silêncio e proteção de sua reputação.

Saiba mais em 93 anos depois, carta que representa resistência de Mossoró ao bando do cangaceiro Lampião é encontrada.

Maria Bonita e a entrada das mulheres no cangaço

Aos seus 25 anos, Maria Bonita decidiu entrar no grupo e mudou o percurso da presença feminina dentro do cangaço. Ao contrário do que muitos dizem, Lampião não a raptou. Em poucos minutos de filmagem que Benjamin Abrahão realizou na época, ela o revela que entrou por vontade própria.

Confira a seguir mais histórias sobre as mulheres cangaceiras:

Maria Bonita e Lampião viveram uma grande história de amor. A partir disso, as mulheres de muitos cangaceiros passaram a frequentar o cangaço. A mulher cangaceira não perseguia o ideal do combate, permanecendo feminina, vaidosa e até gerava disputas para tê-las.

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As mulheres no cangaço exerceram o papel superior de liberdade ao da mulher do sertanejo na época, como por exemplo, na foto acima o vestido da cangaceira ia até o joelho. Em contrapartida, a mulher do pastoril em volta usava vestido no tornozelo.

O Cangaceiro Corisco e a companheira Dada que já chegou a ser considerada a amazonas do nordeste. Corisco foi um dos personagens de grande importância no  movimento

Outra curiosidade é que elas não cozinhavam, apenas costuravam e estavam com seus homens quando não estavam lutando. Durante combates, elas ficavam escondidas embaixo de pedras, árvores para evitarem até mesmo serem insultadas pelos soldados.

Luiz Pedro e Neném – Foto colorizada e retificada por Ruben

 

 

A moda do cangaço

O guerreiro sanguinário do sertão, nas horas vagas se tornava um bom costureiro. Ele era capaz de combater na caatinga, de matar, sangrar os inimigos e logo depois estar em uma máquina de costura, fazendo estrelas de couro, adornos para as roupas dos cangaceiros.

A estética criada por Lampião

O Rei do cangaço sabia costurar e preparava moldes e desenhos para bordados no papel antes de executar, o que é considerado uma característica de designer. Ele buscava ainda, essa característica como requisito em chefes de subgrupos para transferir o orgulho da cultura cangaceira.

Resultado de pesquisa minuciosa realizada entre 1997 e 2000, Estrelas de couro: a estética do cangaço (Escrituras Editora, 2010), do historiador Frederico Pernambucano de Mello, autor do já clássico Guerreiros do sol (publicado originalmente em 1983), coroa quase quarenta anos de estudos sobre o cangaço, desta vez, abordando especialmente a estética, os símbolos e os trajes de Lampião, Corisco e outros bandoleiros emblemáticos.

Magia e Proteção

A indumentária daqueles homens, neste caso, só seriam comparáveis às dos cavaleiros medievais e dos samurais. Em um ambiente cinzento e árido, usariam roupas coloridas, trabalhadas com esmero, com o objetivo maior de lhes proporcionar uma voz singular, um rosto, uma personalidade.

Já os símbolos “mágicos” nos chapéus, por outro lado, cumpririam não só uma função estética, mas também lhes dariam proteção, ou seja, uma “blindagem mística”. Por isso, o uso de signos-de-salomão, estrelas de oito pontas, cruz-de-malta e flor-de-lis, por exemplo, vestígios quinhentistas e seiscentistas que teriam permanecido até quase meados do século XX, uma clara referência do autor à força exercida pela cultura e pelas mentalidades dentro de uma análise histórica de longa duração.

 

As estrelas de couro eram uma referência importante no traje dos cangaceiros. Um símbolo mágico que trazia proteção.

Armas

Os cangaceiros usavam fuzis, mosquetões, bacamartes, espingardas, mas as armas principais eram os punhais. O punhal, entretanto, se tornou o ícone e era usado na parte da frente de seu vestuário, como pode ser visto na foto acima.

O historiador Frederico pesquisou por anos sobre o cangaço e recebeu, inclusive,  peças, objetos e utensílios dos cangaceiros.  Desta forma, pode observar a riqueza dos detalhes e da estética presente em cada um dos objetos.

O colorido, a riqueza de detalhes e seu paradoxo

O colorido e cores definidas, a característica bela da estética arcaica e harmonia revela um paradoxo entre a figura de criminosos e a que fazem essas peças.

Foto/Reprodução

As roupas de couro, os adornos de metal influenciaram a estética dos cabras de Lampião. Assim como ocorre com a moda em geral, os modismo também ocorreram na história do cangaço. É perceptível, por exemplo, o enriquecimento estético quando Lampião se torna  chefe.

Veja também: Linho, história e significado: da pré-história à pós-modernidade

Sandálias ao contrário

Um dos mitos que envolvem os cangaceiros é o uso de sandálias ao contrário, para despistar quem os seguiam. Na verdade, Lampião chegou a encomendar e usar solados retangulares, sem curvas, para que as pegadas não indicassem o sentido em que ele estava indo.

Confira mais fotos originais da época de Lampião e dos trajes usados no cangaço:

Fotos originais da época do cangaço
Imagens de cangaceiros e a estética usada por eles em seu vestuário

 

A morte e legado do Rei do cangaço

Há quem o ame e quem odeie. Para alguns heróis, para outros vilão sanguinário.

Contradições

Assim, a quem defende que a origem humilde revestiu o banditismo dos cangaceiros de um “escudo ético”, tanto entre população da época, quanto a de hoje em dia.  Enquanto, existem relatos de que eram pessoas bem-educadas, justas e com rigidez moral.

O Casal de cangaceiros – Moderno e Durvalina.

Já outra parcela da população os enxerga como bandidos assassinos que agiram com violência, destruíram cidades, cometeram estupros e não respeitavam as leis. Não deveriam, portanto, ser alçados à condição de heróis e seus atos violentos não deveriam ser relativizados.

Entretanto, os cangaceiros ainda são associados à figura da valentia, como homens e mulheres destemidos que lutavam contra o poder político e a elite agrária, embora em muitos casos eles não estivessem em conflito de fato com o poder, sendo até apoiados por personalidades influentes.

O fim do cangaço

Por último, o rei do cangaço foi traído, quando o esconderijo do grupo foi delatado para as forças policiais. Por fim, em 28 de Julho de 1938 ocorreu a morte de Lampião, Maria Bonita e mais 9 cangaceiros.

Estava findo o combate,
Essa luta pavorosa.
O bando d Lampião
Já não contava mais prosa,
O sertão estava livre
Dessa gente perigosa.
Combate e morte de “Lampião”

 

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